terça-feira, 17 de maio de 2011

Ricardo Reis

Ficha Informativa de Português – 12º Ano


“Para ser grande, sê inteiro: nada
        Teu exagera ou exclui.
  Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
         No mínimo que fazes.
   Assim em cada lago a lua toda
         Brilha, porque alta vive.”



    Ricardo Reis nasceu no Porto, em 19 de Setembro de 1887, às 4h05 da tarde (e dentro da alma do poeta a 29 de Janeiro de 1914). Educado por jesuítas, era médico e auto exilou-se, em 1919, para o Brasil.
    Este heterónimo projecta Pessoa para a antiguidade clássica. É o poeta das Odes, o poeta que, à semelhança de Horácio, se refugia na aparente felicidade pagã que lhe vela e esbate o desespero. Proclama uma sabedoria desenganada e surge como a apologia da inteligência de Fernando Pessoa.  Em “Páginas Intimas”, diz: «Pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental vestida de música que lhe é própria.» É, segundo Gaspar Simões, através de Ricardo Reis que Fernando Pessoa se aproxima de si mesmo. Em Reis vê-se não só o mundo de angústias que afecta Pessoa, mas a apatia, a desilusão perante o mistério da vida sem soluções. Tudo é incerto, nada fica de nada, nada somos, tudo passa, tudo muda.

“Senta-te ao sol. Abdica
  E sê rei de ti próprio.”

A filosofia de vida de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o “carpe diem”, como caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos. Apesar deste prazer que procura e da felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade, ou seja, a ataraxia. Sente que tem de viver em conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e ao desprazer, numa verdadeira ilusão da felicidade, conseguida pelo esforço estóico disciplinado. Reis é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas.

Sobre Ricardo Reis, o que disse:

Fernando Pessoa

“ A obra de Ricardo Reis apresenta um epicurismo triste pois, na vida, apesar do prazer e da felicidade que se deve buscar, nunca se encontra a calma e a tranquilidade. Assim, devemos buscar dar-nos a ilusão da calma, da liberdade e da felicidade, coisas inatingíveis, porque, quanto à liberdade, os próprios deuses – sobre que pesa o Fado – a não têm; quanto à felicidade, não a pode ter quem está exilado da sua fé e do meio onde a sua alma devia viver; e quanto à calma, quem vive na angústia complexa de hoje, quem vive sempre à espera da morte, dificilmente pode fingir-se calmo. A obra de Ricardo Reis, profundamente triste, é um esforço lúcido e disciplinado para obter uma calma qualquer.”

Jacinto do Prado Coelho

“ Mais pungente ainda que a ideia da Morte é a sensação de que a vida consiste numa série de mortes sucessivas, de que o tempo é irreversível.[…] Assim, angustiado perante o Destino mudo que o arrasta na voragem, Reis procura na sabedoria dos antigos um remédio para os seus males. Também os gregos sofreram agudamente a caducidade e o peso da Moira cruel. Simplesmente, optaram por aceitar com altivez o destino que lhes era imposto. […] Embora com tintas de estoicismo, devido talvez ao facto de ser Horácio o seu autor de cabeceira, Reis formula uma filosofia de vida cuja orientação é, na verdade, epicurista.[…] O homem de sabedoria edifica-se, conquista a autonomia interior na restrita área de liberdade que lhe ficou. Essa conquista começa por um acto de abdicação. […] O segundo objectivo é evitar as ciladas da Fortuna, depurando a alma de instintos e paixões que nos prendam ao transitório, alienando a nossa vida. Com Epicuro, o filósofo da «cariciosa voz terrestre», que via tranquilamente a vida «à distância a que está», digno como um deus, aprendeu Reis que a ataraxia é a primeira condição de felicidade. A ataraxia, note-se, não implica para Epicuro ausência de prazer mas indiferença perante todo o prazer que nos compromete, colocando-nos na dependência dos outros ou das coisas. Além da sensação elementar de existir, os prazeres tipicamente epicuristas são espirituais, como a volúpia levemente melancólica do passado. Na poesia de Reis é constante a desconfiança perante a Fortuna, os sentimentos fortes, o prazer. […] Moralistas ambos, tanto Reis como Horácio, fundam a sua filosofia prática na reflexão sobre o fluir do tempo, a inanidade dos bens terrenos, os enganos da Fortuna e a Morte.”

E ainda, sobre o Neopaganismo e o Fatum, Jacinto do Prado Coelho, escreveu:

“ Na poesia revela uma formação literária clássica. O seu conceito de vida terrena e extraterrena aparenta-se, em linhas gerais, com o homérico. Simplesmente, é um pagão que duvida, ou não fosse discípulo de Caeiro e condiscípulo de Pessoa…
   Lá em cima, no Olimpo, em banquetes ao som de música inefável, divertem-se eternamente os deuses. Repetem sempre os mesmos gestos, como o Sol percorre sempre a mesma rota, como a perene maré enche e esvazia incansavelmente. O ritmo do seu viver é o «ritmo das ninfas repetido, / Quando, sob o arvoredo, / Batem o som da dança».
   Em Reis a concepção dos deuses é vária e incerta. Vivem perto de nós, «tranquilos e imediatos», nos rios, nos campos e nos bosques. […] Acima de nós e dos deuses, Reis pressente uma força maior, uma entidade implacável a que todos obedecemos: o Fado. Nem a vastidão vã do firmamento é livre: os próprios astros, como nós passageiros, estão submetidos à lei comum. O Fado dita os nossos passos da nossa breve carreira, ao fim da qual se encontra a Morte.”



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